Quando as mulheres finalmente chegam ao auge de muitas profissões, muitas vezes descobrem um mundo mais coberto de verrugas do que de um belo príncipe. Como Dorothy em O Mágico de Oz, quando elas conseguem ver por trás da cortina, elas descobrem que a máquina do poder pode ser mais fanfarronice do que substância.   Avivah Wittenberg-Cox

Em maio de 2020, a revista Forbes publicou um artigo bastante interessante sobre a atuação das mulheres na Economia, assinado pela colunista acima.

No artigo, ela faz menção às conquistas que essas mulheres obtiveram em assuntos de ordem social e econômica que geralmente são bem mais atribuídas aos homens.

O trecho mencionado acima se destaca no texto, onde ela faz menção à história do Mágico de Oz, ficção escrita em 1900, pelo teosofista L.Frank Baum e celebrizada no cinema em 1939.

E a partir dela, podemos fazer algumas analogias.

Síntese da história

Para quem não conhece, conta a história da menina Dorothy, cuja casa no Kansas é levada por um ciclone para Oz, uma terra distante e, aparentemente, muito mais bonita e próspera. Na aterrisagem, a casa cai sobre a Malvada Bruxa do Leste, matando-a, o que faz de Dorothy uma heroína. Mas ela é desafiada pela Malvada Bruxa do Oeste.

A Bruxa Boa do Norte lhe diz que, para conseguir voltar para casa, ela terá que ir até a cidade das Esmeraldas, falar com o poderoso Mágico de Oz.

No caminho de tijolos amarelos ela encontra:

  • um espantalho que deseja ter um cérebro;
  • um lenhador de lata, que deseja ter um coração e
  • um leão medroso que deseja ter coragem.

Juntos seguem até o mágico, que lhes faz uma série de exigências para atender aos pedidos, sendo a principal delas a vassoura da Malvada Bruxa do Oeste.

Após cumprirem todos os desafios, descobrem que o grande mágico é, na verdade, um charlatão, mas que acaba demonstrando para todos que o que eles mais querem já trazem consigo.

Ele somente não consegue atender ao pedido de Dorothy mas essa descobre, através de Glinda, a Bruxa Boa do Sul, que ela sempre teve o poder de voltar.

— Seus sapatinhos prateados (e não de rubi, como no filme) vão carrega-la pelo deserto – respondeu Glinda. – Se você soubesse do poder deles, poderia ter voltado para sua tia Em no dia em que chegou nesta terra… Tudo o que você tem que fazer é bater os calcanhares três vezes e ordenar que os sapatos a carreguem para onde você quiser ir.1

Cientes da história, vamos conhecer as homenageadas pela revista Forbes.

Mulheres Economistas

O texto da revista, na íntegra, encontra-se abaixo2. Nele podemos encontrar a alusão a 5 economistas mulheres que se destacaram por suas obras e prêmios no cenário internacional.

São elas:

Mariana Mazzucato, professora da University College London e fundadora / diretora do UCL Institute for Innovation and Public Purpose. Ela questiona o que é realmente valor econômico e quem o cria. Ela menciona que a Economia deve servir a Sociedade, ao invés de justificar a desigualdade e servidão entre povos e nações. Tem também uma excelente publicação a respeito do papel do Estado no financiamento das grandes inovações tecnológicas apropriadas pelo setor privado da Economia.

Stephanie Kelton, faz questionamentos a respeito das dívidas, diferenciando dívidas de países das dívidas contraídas em níveis mais micro, como famílias e empresas, uma vez que esses agentes não podem gerar moeda ou mesmo definir taxa de juros. Ela aponta para o real significado do dinheiro, enfatizando que os déficits pode ser utilizados tanto para construir uma economia mais justa como para “financiar guerras injustas que desestabilizam o mundo e custam milhões de vidas.”3

Kate Raworth, pesquisadora do Instituto de Mudança Ambiental da Universidade de Oxford e autora da obra Economia Donut. Ela questiona a ênfase dada ao crescimento contínuo e constante e seus reflexos na Vida e no Meio Ambiente. Demonstra também que as mensurações feitas pelo PIB – Produto Interno Bruto – não contempla vários efeitos econômicos, ignorando, por exemplo, toda a gama de trabalho não remunerado como os serviços domésticos e de cuidados em geral, bem como o direcionamento dado aos recursos, seja voltado para fabricação de armas ou para a obtenção de água. Ela defende um crescimento sustentável, baseado em um modelo regenerativo e distributivo.

Carlota Perez, repensa crescimento econômico. Sugere desmaterializar esse crescimento e não somente desacelera-lo, mediante o grande contingente de recursos que consome. Aponta também para a necessidade de novos estilos de vida, mais alinhados com a sustentabilidade, calcados em revoluções tecnológicas que permitiriam: “mais serviços em vez de mais coisas, trabalho ativo e criativo, foco na saúde e cuidados, uma mudança para a energia solar, uso intenso da internet, preferência pela customização em vez de conformidade, aluguel versus propriedade e reciclagem em relação ao lixo.”4

Esther Duflo, professora de Economia da Pobreza e Desenvolvimento do MIT, tem suas propostas mais voltadas para a erradicação da pobreza do mundo, com melhor orientação, de forma a causar impactos positivos e efetivos. Ela questiona os bilhões direcionados para a ajuda sem uma real compreensão da situação ou mesmo qualquer medição dos retornos, principalmente em questões como educação e saúde, com ênfase na situação da malária. Ela e seu marido ganharam o Prêmio Nobel de Economia de 2019, por conta dos resultados com testes de controle aleatório em centenas de locais de vários países do mundo.

Papel do Estado

Todas elas querem que o Estado represente um papel determinante na Economia.

Carlota Perez, por exemplo, defende o equilíbrio da sustentabilidade econômica com a social, no contexto das revoluções tecnológicas que estamos vivenciando.

Mariana Mazzucato convida os governos a serem mais proativos na apropriação dos resultados gerados pela iniciativa privada mas que foram fortemente financiados com verbas governamentais, principalmente no quesito das pesquisas básicas iniciais. Segundo ela, “em muitos casos, investimentos públicos se transformaram em entrega de negócios, enriquecendo indivíduos e suas empresas, mas oferecendo pequeno (direto ou indireto) retorno para a Economia ou para o Estado.”5

Kate Raworth, destaca: “O Estado como parceiro econômico capacitador e empoderador… soa tão bem… será bom demais para ser verdade?” Mas ela o classifica em Estado com políticas econômicas inclusivas ou extrativas. As primeiras beneficiam a maioria da população, enquanto as outras privilegiam poucos em detrimento da maioria. De qualquer forma, para evitar qualquer tirania, tanto do Estado quanto do Mercado, o ideal é a prática de uma política democrática, que promova “engajamento cívico necessário para a participação e responsabilização na vida pública e política.”6

Analogias

Como podemos ver, todas elas fazem questionamentos e apontam para a necessidade de uma grande mudança, do cenário árido do Kansas para um mundo mais colorido e abundante de Oz.

Obviamente o ciclone das Novas Tecnologias e da Sociedade em Rede, tornam essa viagem bem  possível, nos dias atuais.

Para percorrer esse caminho de riquezas amarelas e chegar na cidade das esmeraldas verdes, nossas dorothies tem por companhia suas mentes prodigiosas, seus olhares mais profundos e amorosos em relação ao contexto mundial e, sem dúvida alguma, uma coragem sem tamanho para o enfrentamento das críticas conservadoras.

Dessa forma, derrotando as malvadas bruxas do Leste e Oeste e se valendo do apoio das boas bruxas do Norte e do Sul (qualquer semelhança com as regiões cardiais do planeta não será mera coincidência), nossas heroínas buscam os seus intentos, ou seja, regressar para uma casa que, apesar de cinza e pobre poderia, sim, ser mais rica, próspera e igualitária.

Mas, como a autora do artigo bem pontuou, ao buscar a ajuda do Poder constituído descobrem que não há poder algum, são efeitos especiais que somente acentuam as crenças de quem lhes atribuem poder.

Em nosso caso, o Mago poderia ser o Mercado, que estabelece suas próprias regras e exigências para atender as necessidades da Sociedade. Ou ainda o Estado, que  regulamenta esse Mercado mas, ao mesmo tempo, também o ampara em uma correlação de forças ambígua e incerta. Nosso Mago contemporâneo tem dupla face.

Por isso, as nossas dorothies, mulheres e economistas vão buscar seus próprios poderes através de suas trilhas e de seus sapatos científicos e lógicos, questionando um mundo em desequilíbrio e apontando alternativas e soluções.

Ao baterem três vezes seus calcanhares, conseguem transformar o árido Kansas, vislumbrando o reflexo colorido e pródigo que sempre lhe foi inerente.


Fontes Consultadas:

  1. BAUM, L. Frank – O Mágico de Oz – São Paulo: Barba Negra : Leya, 2011 – p. 185 e 186

2. FORBES –  https://www.forbes.com/sites/avivahwittenbergcox/2020/05/31/5-economists-redefining-everything–oh-yes-and-theyre-women/?fbclid=IwAR1Sru4lgFkbFOGQHzxKqoBcLGBZDXS7DUuzcJt0fzcbTzkWHeLzNV3wIk8#56d9d8e1714a

3. Idem

4. Idem

5. MAZZUCATO,  Mariana – O Estado Empreendedor – Desmascarando o mito do setor público vs. Setor privado – São Paulo: Portfolio-Penguin, 2014 – p. 37

6. RAWORTH, Kate – Economia Donut: Uma alternativa ao crescimento a qualquer custo – Rio de Janeiro: Zahar, 2019 – p. 97

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Sou Helena Siqueira Dornellas

Me identifico como E-E-E:

  • Sou Economista e atuei no Sistema Financeiro, em Cooperativas, no Terceiro Setor, nas áreas de Planejamento e Gestão.
  • Sou Escritora e publiquei dois livros e vários artigos em diversos canais.
  • Sou Educadora, ministrei aulas de Economia e também de Artesanato, principalmente, de Origami e Macramê. E criei o Macra-Gami, que é a junção das duas artes.

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